Quando a gente vê Michelle Obama, mulher diva empoderada do feminismo e da negritude, tendemos a achar que a imagem dela sempre foi assim, cheia de força e representatividade. Mas a verdade é que ela passou por uma série de mudanças e adequações de imagem e linguagem corporal desde que se tornou pessoa pública (leia-se esposa de candidato negro à presidência dos EUA). A própria Michelle assume e fala sobre isso abertamente no livro e no documentário “Minha história”.
No lançamento da campanha de Barack, em 2007, Michelle tinha uma imagem rígida, clássica e extremamente formal. As peças de roupas eram sempre muito retas e estruturadas. Cores neutras. Sapatos sempre de bico fino e saltos médios.
No decorrer da campanha as cores e estampas foram entrando na imagem de Michelle para suavizar a imagem. Pérolas passaram a ser constantes na imagem da futura-primeira dama, trazendo confiabilidade e feminilidade, mas mantendo a ideia de uma mulher que respeita as tradições. Esses elementos permaneceram durante o mandato de Barack, como estratégia de segurança e aproximação com os cidadãos norte-americanos.
A Michelle de 2020, líder mundial na luta da representatividade, veste tecidos fluídos, brilhos, modelagens modernas e amplas que valorizam o corpo grande que ela tem. Esses elementos trazem acessibilidade, chamam a atenção para ela e reforçam que ela não quer passar despercebida. Que ela deseja sim chamar atenção enquanto mulher e negra com orgulho de sua pele e suas formas. Além disso, aproxima da juventude e tira a formalidade do cargo de primeira-dama.
Os cabelos de 2007 seguiam a mesma linha tradicional e conservadora das roupas: corte médio, sempre muito alinhado e bem liso. Eles foram ganhando movimento durante a campanha e os mandatos com escovas onduladas, mas ainda eram alisados e sempre alinhados para aproximá-la dos eleitores brancos e cidadãos mais conservadores. Hoje esses mesmos cabelos aparecem frequentemente cacheados, remetendo ao blackpower, trazendo orgulho da negritude empoderamento e representatividade para meninas e mulheres que, assim como Michelle, por muitos anos foram escravas de alisamento para se adequar a um padrão branco de estética.
As sobrancelhas de Michelle durante a campanha de 2007 eram bem finas e arqueadas o que reforçavam as expressões marcantes do rosto dela. Com o tempo a oposição passou a usar esses elementos visuais e gestuais contra ela e o marido, mostrando como ela era dura, rude. As expressões e traços faciais foram as primeiras alterações na imagem dela. Aos poucos as sobrancelhas foram engrossando e suavizando. Diversos treinamentos foram feitos para amenizar as “caretas” durante as falas, discursos e aparições públicas. No mantado já vemos uma sobrancelha mais grossa e hoje elas são muito mais suaves do que no começo da vida pública, deixando a imagem dela mais acolhedora.
A linguagem corporal de Michelle também foi trabalhada. Por vezes ela foi clicada em 2007 demonstrando o cansaço natural de uma campanha. O problema é que isso era constantemente usado contra o casal para alegar uma possível incapacidade de governar o país. Hoje é praticamente impossível achar alguma foto em que ela não esteja sorrindo, com postura, peitos abertos e/ou segura e confiante.
Michelle aprendeu, a duras penas, como a nossa imagem pode ser usado contra e a favor da gente. Gestos, cores e formas podem trazer ruídos para nossa comunicação e prejudicar nossa luta em defesa das nossas pautas. Hoje ela faz um uso estratégico da imagem dela. Usa roupa, cabelo, acessórios a favor dela. Se comunica diariamente com a juventude negra e cumpre, mais do que nunca, papel fundamental de ser representação viva e forte de mulheres e negros ocupando espaços decisivos no poder.